Os brasileiros do tempo do Titanic - o que pensaram e o que fizeram diante da tragédia
Na época, a Revista Marítima Brasileira, editada pela Marinha do Brasil, naturalmente não poderia de deixar de destacar em suas páginas a tragédia do navio inglês: “Ecoou por todo o mundo, dolorosamente, a notícia do trágico naufrágio do Titanic, o colossal transatlântico que fazia a sua primeira viagem, da Inglaterra para os Estados Unidos.(...)Os jornais desta capital tem publicado as circunstâncias trágicas em que soçobrou o possante navio(...)Lamentamos com sinceridade essa grande desgraça marítima, sentida como um catástrofe universal. Na terceira sessão preparatória da Câmara dos Deputados no dia 21 de abril, na hora do expediente, o Dr. Serzedello Corrêa, Deputado pelo Estado do Pará, pediu a palavra e sobre o infausto acontecimento e disse o seguinte: ‘A Câmara já tem ciência do enorme desastre do paquete Titanic, onde perderam a vida centenas de ingleses e norte-americanos. A dor a que se apodera do coração brasileiro, ante esse infausto acontecimento, que tão duramente atinge duas nações amigas, é verdadeiramente indizível. Proponho, pois, que seja inserto em ata um ato de profundíssimo pesar e que ao mesmo tempo fique a Mesa autorizada a dirigir-se ao governo inglês e norte-americano, transmitindo-lhes as sinceras condolências da Câmara dos Deputados do Brasil.’E continua a Revista Marítima: “Foi aprovado unanimemente o requerimento. Os Srs. presidente da República e ministro da Marinha enviaram condolências às duas nações amigas, mais de perto atingidas pelo pavoroso sinistro. Por enquanto não é possível fazer-se um juízo seguro sobre as causas primordiais desse desastre, que produziu grande consternação e natural admiração, por ser tratar de um navio novíssimo, contruído em afamados estaleiros em Belfast e dirigido por um provecto comandante, velho lobo do mar, encanecido nas travessais do Atlântico.Realmente é para causar apreensões e duvidas a rapidez com que se afundou esse leviatã dos mares construído cuidadosamente de todo o seu casco convenientemente dividido em compartimentos estanques ! Uma coisa porém ficou bem patente, segundo os telegramas recebidos de New York; o Titanic só tinha quatorze embarcações salva-vidas e mais quatro menores, suficientes para salvar apenas 850 pessoas, quando a bordo havia 2340. Isso demonstrou um certa negligência da White Star e não sabemos como se poderá defender das justas recriminações, se fora verificado que o Titanic só tinha as referidas 18 embarcações. Não deixa também de ser aceitável a suposição de que os compartimentos estanques não foram fechados a tempo, havendo ainda certa imprudência do comandante que preocupado com o recorde da travessia se esqueceu das circunstâncias especiais em que navegava, por uma noite fria, de nevoeiro, estando o mar coalhados de enormes massas de gelo.”Já a revista Liga Marítima publicou alguns interessantes artigos sobre posições tomadas entre os brasileiros face ao naufrágio. Eis a transcrição de um desses artigos: “Um Invento Marítimo Brasileiro - Nossos jornais, reproduzindo gravuras e conceitos de seus colegas de Paris, já registram com certo desvanecimento as experiências, ali realizadas, de um novo invento brasileiro, destinado à souvatage. Trata-se de um aparelho engenhoso, do nosso patrício Dr. Silvio Portela, cirurgião militar, natural da Bahia, em cuja Faculdade médica deixou fama de aplicado, estudioso e inteligente em grau notável.O aparelho do inventor brasileiro, que foi experimentado no dia 13 de outubro, em Paris, com pleno sucesso perante numerosa assistência, consiste numas asas flutuantes, fixas e enroladas nos dois costados do vapor. No momento do sinistro, essas asas desenrolam-se e enchem-se de ar, permitindo que o vapor se mantenha flutuando durante alguns dias até poder ser socorrido. O Dr. Silvio Portela foi muito aplaudido e felicitado pelos assistentes.Encontramos na crônica do O País, enviada por um correspondente de Paris, estas linhas, documentando o acontecimento: Diz o correspondente: ‘assistimos domingo último, no Magic City, em Paris, às experiências do aparelho de salvação salva-navios, do Dr. Silvio Portela. Ouvimos a sua interessante conferência e depois, vimos as evoluções do seu pequeno barco com asas flutuantes de borracha protegidas por tampas metálicas. Médico do Exército brasileiro, o Sr. Portela viera a Paris, estudar o 606 e outras medicações novas da sífilis. Mas, depois do desastre do Titanic, o ilustre clínico brasileiro procurou os meios práticos para evitar futuros naufrágios. Após longas experiências, construi o seu aparelho que empregado com precisão e precaução, poderá ser o único meio de evitar a repetição de catástrofes semelhantes a do colossal Titanic. O Dr. Portela tem já a patente de invenção para os principais países marítimos. Mais de cem brasileiros e muitos membros da imprensa assistiram a conferência do Dr. Portela, e em seguida as experiências que tiveram lugar no lado do Magic City. No dia seguinte, vários jornais publicaram notas curiosas da obra tão profundamente interessante do inventor brasileiro, e o Excelsior inseriu mesmo a gravura do aparelho’O médico brasileiro é esperado em breve, de regresso ao país, e oportunamente nos ocuparemos com melhor informação do curioso aparelho que vem prestar grandes benefícios à navegação. Desde já, porém, a Liga faz o mais ardentes votos pela eficácia e praticabilidade de tão oportuno e esperançoso invento.”